10 de julho de 2010

Kosmische Kosmetik XIV

Känguru é o terceiro tomo da vasta e dispersa discografia dos Guru Guru. Após o extremismo alucinogéneo de UFO (1970) e as aventuras free-form de Hinten (1971), este disco de 1972 encontra o colectivo alemão em territórios mais concisos e formais, se bem que mantendo algumas conexões neuronais ao passado psicotrópico. Desde sempre liderados pelo baterista e vocalista Mani Neumeier, músico com provas dadas na cena free jazz europeia desde os anos 60, os Guru Guru são mais uma das bandas que borbulham no caldeirão do krautrock, mas que encerram outros tesouros escondidos para além da rotulagem.
Intensamente jazzística e dotada de um imenso poder idiossincrático e de improviso, a banda lança em Känguru a sua cartada mais certeira e, provavelmente, a sua obra melhor conseguida. Espraiado por 4 temas sem medo da expansão temporal, é uma fonte de maravilhas mascarada de guitarras oceânicas e ritmos em total liberdade.
Oxymoron abre o álbum viscosamente, com as seis cordas, o baixo e a bateria a imiscuirem-se pantanosamente e a arrastarem-nos para a sua dimensão pegajosa. Neumeier trata os bombos e os pratos como só ele sabe e entrega-se a uma ladaínha que soa a um blues confusional. Ooga-Booga fecha o disco revisitando os trâmites do rock'n'roll clássico, para depois o virar do avesso e expôr-lhe as entranhas dilaceradas por golpes psicadélicos e mordidelas tribalísticas. Como sempre, o óbvio não mora aqui e o imprevisível espreita a cada nota debitada. Pelo meio, ficam Immer Lustig e Baby Cake Walk. A primeira faz-se anunciar por uma espécie de apresentação de combate de luta livre, ao que se segue uma marcha pesadona em tons de fanfarra. É então que a peça se fractura, vagabundeando à nossa volta por mais um quarto de hora, em tonalidades que vão do jazz ao rock mais enérgico e catártico, passando obrigatoriamente pela espiral do improviso. A segunda é uma rockalhada poderosíssima à moda germânica, que implora por ser ouvida bem alta. Aliado à voz pejada de efeitos de Mani Neumeier, este tema assemelha-se à deliciosa mas impossível plausabilidade de juntar o Jimi Hendrix de Electric Ladyland aos Hawkwind de In Search of Space.
Um clássico à sua maneira, Känguru é uma hora garantida de música abismal e impressionante. Uma máquina teutónica de fazer sons, tão fria na precisão como destrambelhada no seu caos caleidoscópico. Basta dizer que é mais um lançamento da seminal editora Brain...