6 de fevereiro de 2021

Kosmische Kosmetik LVI

 

O nome não podia ser mais óbvio e, no entanto, soa descaradamente a lugar-comum: Krautwerk. Bebe do movimento musical alemão e de um dos seus grupos seminais. Trata-se de uma one man band criada por Nico Seel, projecto essencialmente artesanal que tem debitado discos em cadência constante desde 2014. 
Além dos Kraftwerk como óbvia referência, o músico germânico presta reverência aos Neu!, e aos Can ao longo dos 7 álbuns lançados até à data, sendo o responsável pela execução de todos os instrumentos que compõem a sua tapeçaria sonora. Todas as obras apresentam semelhanças em termos de forma e conteúdo, constituindo peças quase académicas na forma como estudam e depuram o núcleo da sonoridade austera, motorizada, mas igualmente melódica e emotiva, encapsulada no melhor Krautrock.
1971 é o nome do primeiro álbum de Nico Seel sob o pseudónimo Krautwerk. Explorá-lo auditivamente é uma experiência deveras desconcertante, porém fascinante. Dir-se-ia estarmos perante um disco perdido dos Neu!, gravado algures entre Neu!2 e Neu!75, que ficou conservado em âmbar numa cave escura e foi milagrosamente redescoberto em 2014.
Ao longo de seis peças, somos transportados por um maravilhoso mundo de guitarras reverberantes, ritmos motorik, melodias intrusivas e constantes momentos de deleite abandónico.
Os temas que compõem 1971 não têm título, somente um número. Provavelmente porque o álbum deve ser ouvido como ou todo, exercendo, dessa forma, o seu poder hipnótico e físico. Tal como o melhor dos Neu!, este disco aponta miras ao cérebro e ao corpo em simultâneo, alimentando ambos por igual e convidando a um escapismo sedutor e sem efeitos perniciosos.
Em adição aos seis poderosos e irrepreensíveis temas originais de 1971, as novas edições do álbum contêm mais dois temas, igualmente sem nome e identificadas como VII e VIII. Pese embora apresentarem uma toada mais agressiva e decorada por elementos electrónicos, ambos apenas ajudam a prolongar o prazer sensorial dos apreciadores de tais sonoridades.
Pode ser uma pastiche descarada dos Neu!. Pode ser uma respeitosa homenagem ao duo composto pelo malogrado baterista Klaus Dinger e o guitarrista Michael Rother. Pode ser ainda uma tentativa de replicar a sonoridade dos mesmos em pleno século XXI. Sendo isso tudo, ou nada disso, 1971 é um absoluto deleite.