15 de dezembro de 2018

Riffestival

Related imageA New Wave of British Heavy Metal constitui um fenómeno peculiar e interessante. Surgido nos finais dos anos 70, em plena ressaca do Punk e do despontar da New Wave, o movimento manteve a infraestrutura pesada e entorpecente dos Black Sabbath e Led Zeppelin, acrescentando-lhe a energia efeverescente do Punk. Sendo que os catedráticos Motörhead jogaram o ás de espadas deste baralho, outras bandas mais ou menos entusiasmantes se lhes juntaram, entre as quais os Diamond Head.
O que distinguiu este quarteto oriundo de Stourbridge dos seus pares, especialmente no seu primeiro álbum, assentou numa inebriante mescla de composições complexas, melodias invasivas, ritmos vertiginosos, produção em bruto e, especialmente, na feérica e endiabrada guitarra de Brian Tatler.
O nome da banda inspirou-se no primeiro disco a solo de Phil Manzanera, guitarrista dos Roxy Music, e o que se escuta em Lightning To The Nations é um verdadeiro diamante por lapidar, tresandando a cabedal, tabaco e cerveja, rodopiando em velocidade e volume proibitivos numa cave funda a altas horas da noite.
Extrapolando, Lightning To The Nations poderia ser a versão pesada de Marquee Moon dos Television. As composições, na sua maioria extensas, rendilhadas e caleidoscópicas, inflectem para um idêntico banho de imersão quente no Rock. Mas, enquanto a banda nova-iorquina explora as guitarras como objecto sedutor e pensante, os britânicos enveredam para territórios virtuosos e ardentes. A guitarra de Tom Verlaine é amor romântico, a de Brian Tatler amor carnal. Ambos são fabulosos e distintos exemplos de como tratar as seis cordas como trave-mestra da canção.
Ouvido à distância de 38 anos, Lightning To The Nations não traz nada de novo. Mas revela a majestade dos clássicos. Composto por apenas sete composições, todas originais, a riqueza que guarda é notável. O tema-título abre as hostilidades com pompa, circunstância e violência. Um ataque cerrado e sem tréguas, sucedido pelo assombroso The Prince, uma mistura entre a velocidade cega dos Motörhead e o instinto melódico dos Iron Maiden, que resulta numa alucinante montanha-russa rítmica guiada por uma guitarra sem freio. A voz de Sean Harris acaba por ser o elemento mais clássico da banda, algures entre Robert Plant e Geddy Lee.
Ainda mal refeitos dos efeitos desta erupção vulcânica, surge o monstruoso Sucking My Love, momento em que o ouvinte é definitivamente sugado para a garganta incandescente dos Diamond Head. Dez minutos de groove obnubilante, acompanhado de uma tareia de guitarra de ouvir e chorar por mais. Dez minutos que lançaram prolíferas sementes no metal dos anos vindouros. É impossível não vislumbar no riff de guitarra final desta canção laivos do que viria a ser Seek & Destroy dos Metallica, sendo que o primeiro álbum dos norte-americanos - Kill'em All - bebe muito destas águas. Aliás, os reis do Thrash Metal nunca esconderam a influência dos Diamond Head, tendo, inclusive, gravado versões de dois temas de Lightning To The Nations, o que ajudou à evolução do culto em torno desta obra ao longo dos anos. Foram eles Am I Evil e Helpless, peças imensas e intensas - a primeira derivativa do universo ocultista dos Black Sabbath (curioso como as tendências passam de geração em geração), a segunda assente numa abordagem mais explícita ao Punk.
Merece especial realce a reedição do álbum editada em 2011, a qual contém um segundo disco de material nunca reunido em disco anteriormente e que oferece um excelente complemento aos primeiros anos de existência dos Diamond Head.
Infelizmente, a banda britânica nunca mais conseguiu repetir a qualidade extraordinária de Lightning To The Nations, resvalando progressivamente para a obscuridade, apesar de ainda manter a actividade. Esta primeira obra, justamente considerada um marco pioneiro na credibilização do Metal nas suas várias vertentes, deverá ser considerada, acima de tudo, uma peça fulcral na evolução do xadrez primordial do Rock. PLAY IT LOUD!