26 de novembro de 2017

Flor Solitária

Os londrinos Synanthesia foram mais um caso perdido na folk vanguardista que despontou no final dos anos 60. Mais um broto cortado antes que lhe fosse permitido florescer em toda a plenitude. Seja pela excessiva proliferação do género na época em epígrafe, seja por pura ignorância e desinteresse do público e/ou das editoras, certo é que este interessante colectivo britânico saiu do alcance dos radares após a edição do seu primeiro álbum e nunca mais voltou para contar a história.
O disco homónimo dos Synanthesia, lançado em 1969, é um inspiradíssimo tratado do tratamento cirúrgico e inovador aplicado à folk britânica dessa década, sendo que merece elevado reconhecimento pela  exibição de inovação associada à intemporalidade. Perfeitamente encaixável no catálogo dos clássicos perdidos, a obra solitária da banda exala misticismo, romantismo e paganismo, não necessariamente por esta ordem. O rigor composicional e a depuração instrumental são elementos relevantes e impossíveis de descartar num trio exclusivamente acústico e sem secção rítmica clássica definida.
As raízes musicais dos membros dos Synanthesia reflectem o ecletismo padronizado na obra. Dennis Homes, vocalista principal - tarefa que acumula com a guitarra acústica e o xilofone - é um homem do rock. Jim Fraser domina os sopros, da flauta ao saxofone, e transita directamente do jazz. O multi-instrumentalista Leslie Cook surge como o elemento da folk mais purista, adicionando elementos como o bandolim e o violino à já rica paleta musical.
Synanthesia carrega a beleza de uma tarde outonal, ora sombria ora solarenga. É um disco aconchegante, embora não desdenhe enveredar por caminhos de estranheza e mistério. Existem várias referências mitológicas ao longo da obra, acentuando a sua vertente dionisíaca. Mnemosyne e Vesta assistem à folk sendo devorada pelo jazz e saindo saciada do banquete. Minerva envereda por luminosos carreiros pastorais e o excelente Morpheus condensa na perfeição o conceito caleidoscópico do álbum.
Igualmente dignos de destaque são o bucolismo acinzentado de Peck Strangely and Worried Evening, a introspecção taciturna mas doce de The Tale of the Spider and the Fly e a melancolia crepuscular de Just as the Curtain Finally Falls. Synanthesia foi alvo de reedição há muito aguardada em 2005, a qual vale, sobretudo, pela adição do único single editado pela banda durante os seus parcos dezoito meses de existência. Intitula-se Shifting Sands e serve uma belíssima e suculenta fatia de folk psicadélica, farta de cores oníricas e abandono melódico.
O único álbum dos Synanthesia reflecte, tal como tantos outros à sua época, uma miríade de influências, que vão de Donovan à seminal Incredible String Band. Não obstante, o tratamento dado pelo trio londrino às suas referências acaba por emulá-las e transcendê-las, o que torna este disco obrigatório para qualquer entusiasta ou completista do melhor que os anos 60 ofereceram em termos de florescimentos musicais.