14 de junho de 2009

Dieta Mediterrânica II

Os segundos iniciais de Principe di un Giorno parecem transportar-nos directamente para a noite de um remoto Carnaval Veneziano. A guitarra serena e a flauta morna passam, então, a comandar as operações em mais uma obra notável da música italiana dos anos 70. À faixa supracitada, primeiro tema que dá título ao único álbum dos Celeste, poderíamos chamar música balsâmica de San Remo, homenageando quer o aceto de Modena, quer a terra natal destes transalpinos. Uma autêntica massagem à alma, pricipalmente a partir da entrada dos instrumentos de sopro ao raiar dos 4 minutos da canção. Infelizmente (mas, também, felizmente!) este capítulo da música europeia continua votado à marginalidade e bafeja somente quem mergulha profundamente nos seus alfarrábios. E só mergulhando se podem alcançar caleidoscópios sonoros absurdamente belos e majestosos como Favole Antiche. Repentinamente somos colocados no cenário de A Midsummer's Night Dream de Shakespeare e não queremos acordar. O eco estático daquela voz que sopra ao ouvido e a irrealidade do ambiente criado fazem-nos crer que é possível dançar com ninfas e brincar às escondidas com duentes se aparecermos naquele bosque, naquela noite. Segue-se o belíssimo Eftus, em que vozes dispersas em suave psicadelismo despontam por entre a serenidade de laivos renascentistas invocada pelos instrumentos. Giocchi nella Notte é outro eloquente momento melódico, romântico na forma como principia a insinuar sem revelar nada para além do translúcido. Divido em vários fragmentos, este tema termina numa toada folk pastoral que nada fica a dever aos seminais The Incredible String Band. La Grande Isola é rock progressivo clássico, com instrumentação vária e irrepreensível à desgarrada, mas em que o mellotron é rei e a flauta é raínha. La Danza del Fato sucede-a, agradável e simples balada trovadoresca e polvilhada de sinos. No fim, L'Imbrolglio encerra o álbum em toada medieval e despojada da pirotecnia contida que ficou para trás. Álbum de traços conceptuais, Principe di un Giorno dos Celeste é algo de irrepetível. Algo que já parecia de um tempo que nunca existiu quando foi editado em 1976...