A prolífica carreira a solo de Hans-Joachim Roedelius é plena de bons momentos. Mais ou menos memoráveis, mas sempre com selo de qualidade. E essa caminhada solitária teve início ainda nos tempos em que o berlinense se movia com audácia e estilo em projectos como os Cluster e os Harmonia.
Foi entre 1973 e 1979 que as peças que compõem Selbstportrait I ganharam vida. E este disco, que deveria ser o primeiro em nome de próprio de Roedelius, acabou por nascer tardiamente, após o magnífico Durch die Wüste e de Jardin au Fou.
Selbstportrait I é o som do músico em introspecção, em relaxamento egocêntrico e despido de artifícios. Minimal, simples, melódica e beatífica, a música patente nesta obra define bem as aproximações de Roedelius à electrónica ambiental, bem mais próximas do seu ocasional colaborador Brian Eno que das texturas mais abrasivas e experimentais dos seus primórdios exploratórios.
Os instrumentos usados, maioritariamente um órgão Farfisa e um sintetizador Revox A77, conferem a Selbstportrait I uma atmosfera de pureza quase virginal e uma proximidade confessional. Música sem filtros, despojada e descarnada, guarda em si o embrião de muitos sons futuros. E quão aconchegante é deixar pensamentos e emoções fluir no suave embalo de In Liebe Dein, Arcona e Girlande. Ou estimulante pintar quadros imaginários ao som de micro-sonatas electrónicas como Inselmoos, Fabelwein ou Halmharfe. Sempre em onírica travessia até ao lullaby final de Minne.
Os auto-retratos de Roedelius continuaram a ser revisitados ao longo da sua existência musical, sendo que o oitavo volume desta série foi editado em 2002. Todos muitíssimo aconselháveis, mas nunca esquecendo que, mesmo com a sua ingenuidade e improviso, não há amor como o primeiro.