Se há música que epitomiza o ideal de caldeirão de culturas, ela provém de Manu Chao. Como líder dos Mano Negra, desbravou caminho pela selva urbana com um misto da energia punk dos Clash cruzada com sonoridades da Jamaica e das Américas equatoriais. Os discos da banda são um abrasivo pot pourri multirracial e multicolorido, que disparam as mais variadas influências em todas as direcções possíveis.
A solo, Manu Chao continua a invocar as mesmas musas, se bem que menos urgentes e extasiadas. Com um clássico absoluto, Clandestino, na sua cartilha, o basco-galego-parisiense entrega-se actualmente a um som mais acústico e ensolarado, uma espécie de folk urbana misturada com tudo e mais alguma coisa, estilhaçada por samples insondáveis e apimentada com fortes especiarias caribenhas e sul-americanas. Genuíno cidadão do mundo, parece nunca ter poiso certo, e os seus álbuns reflectem-no magistralmente. Há um sentimento nómada, uma errância querida e uma liberdade sôfrega nas suas canções, que vagabundeiam pelos discos em várias línguas diferentes e aproveitando fragmentos umas das outras. Imiscuem-se a intervenção política, o vazio de ser estranho em terra estranha e a denúncia da opressão, ou não fosse Manu Chao confesso simpatizante do mexicano EZLN, mais conhecido por Ejército Zapatista de Liberación Nacional. Dá vontade de nomeá-lo o Che Guevara do pop-rock...
Infelizmente, nunca o vi actuar. A ele, que aparece em todo o lado. Que dá concertos de graça para grandes audiências. Dizem que é dono de um bar em pleno Barri Gotíc da fervilhante Barcelona e que, por vezes, irrompe pelo bulício nocturno de guitarra em riste. Chama-se Mariatchi e já lá estive duas vezes, esvaziando Voll-Damm's. Do homem, nem rasto...
Falando em aparições, eis Manu Chao materializando-se nas ruas de Buenos Aires, no seu melhor de artista do povo. E comovendo outro artista do povo como ele, El Pibe, nesta cena memorável engendrada por Kusturica...