31 de dezembro de 2018

A Marca Amarela X

Related imageTal como Debon dos Brast Burn, dissecado no post anterior, Alomoni 1985 é igualmente uma obra solitária. Desta feita, conjurada pelos não menos obscuros Karuna Khyal. Além do ano de edição - 1976 - e do facto de ser um produto nipónico, o que sobra deste projecto é um perfeito mistério. Persiste a teoria que ambos os discos provêm do mesmo cérebro (colectivo?), sendo que a música criada pelos Karuna Khyal consegue alcançar níveis de transgressão e delírio ainda maiores que os do seu suposto alter ego.
Alomoni 1985 é igualmente composto por duas extensas peças, onde o experimentalismo reina sem rei nem roque. A primeira assenta num cruzamento não muito improvável - e quiçá apetecível - entre a vertigem improvisada dos Faust e os Blues escangalhados de Captain Beefheart. Uma vocalização repetitiva, acompanhada de harmónica e levada ao colo por uma turba deambulante e cacofónica de instrumentos eléctricos em densa distorção despenha-se num abismo escuro e demencial, onde a música parece presa numa teia, debatendo-se para sair, mas confortável nas suas sedosas amarras.
A segunda parte do álbum tem o mérito de ser ainda mais radical. As experiências desbragadas e intoxicadas dos Faust continuam a ser a comparação mais óbvia, mas aqui o pontual humor dos germânicos transfigura-se numa interminável bad trip, numa marcha ritualista em círculos, cadenciada e repetitiva, cuja espiral se adensa até ao abrupto corte final. A matéria-prima ainda assenta no Rock e nos Blues, mas ambos resvalaram para o precipício da loucura e vagueiam, alienados, por labirintos que não conduzem à razão. Material pesado e para psicadélicos de barba rija.
O único trabalho dos Karuna Khyal constitui, acima de tudo, um artefacto raro e curioso. Descrever a música que guarda é como relatar um estranho sonho, do qual só recordamos as partes mais bizarras. Não se trata forçosamente de um pesadelo, mas as forças e substâncias em torno de uma obra tão extrema revelam mentes em estado de entropia profunda. A escutar com ouvidos bem abertos, em ambiente seguro, escuro e solitário.