Richard Thompson, um dos grandes guitarristas da história da música britânica, já não fazia parte dos seminais Fairport Convention. Linda, a futura esposa, era uma cantora de estúdio que ele abraçou sentimental e musicalmente. O primogénito fruto artístico da colaboração, I Want to See the Bright Lights Tonight, datado de 1973, é um disco praticamente intocável, comovente até para um coração empedrenido, espiritual até para um físico quântico.
Não há um tema que desponte acima dos seus pares. Persiste apenas a teimosia da perfeição. Richard dá voz a temas mais vincadamente tradicionais, como o sonho de fuga à opressão de When I Get to the Border e We Sing Hallelujah. A Linda e à sua forte e expressiva voz ficam entregues baladas lindíssimas como Withered and Died ou a solidão desesperada de Has He Got a Friend for Me. Favoritos pessoais, que toldam grandemente o discernimento, são a marcha lenta intitulada The Calvary Cross e o austero e sombrio tema final, The Great Valerio.
Sobra a grandeza dos restantes. E persevera a poesia em todos. Se a música prende pela melancolia, as palavras apertam ainda mais o nó com os seus relatos de vencidos da vida, amores impossíveis, fantasias proletárias e falsas esperanças. E basta aceder ao soturno The End of the Rainbow para ficar refém de um refrão que parece resumir a intencionalidade das letras do disco: Life seems so rosy in the cradle / But I'll be a friend, I'll tell you what's in store / There's nothing at the end of the rainbow / There's nothing to grow up for any more. Enfim, um tema apropriado ao Portugal de 2010...
Mais cinco álbuns sucederam a este. Viria a bizarra conversão do casal ao islamismo no excelente Pour Down Like Silver. E viria Shoot Out the Lights, a última estação antes do divórcio deste casamento que nunca poderia ser apenas musical. E foi este último o disco que mais se aproximou do estatuto de obra-prima alcançado por I Want to See the Bright Lights Tonight. Mais uma prova da grande arte que tanto brota do nascimento como da morte do amor.