11 de julho de 2011

Kosmische Kosmetik XXVI

Here comes the big wave of aggression! Assim se ergue, por entre ventania e ondas, o primeiro álbum dos Gila - homónimo, mas igualmente conhecido como Free Electric Sound. Poderoso e esmagador, é uma das obras-primas da primeira vaga do krautrock, a mais selvagem e mentalmente intrusiva. Sob o látego impiedoso de guitarras à deriva e ritmos assertivos, caímos subjugados pela força de um disco enorme, um tsunami eléctrico.
Será que as quatro mentes que conceberam este portento em 1971 estavam cientes do que faziam? Que acabavam de criar um portal sonoro para uma dimensão de mistérios e maravilhas? O som que debitam é expansivo e imenso, flutuante e majestoso como oceanos de estrelas. Aggression, o primeiro tema, irrompe sem aviso, atacando sem cerimónias e por todos os flancos, com guitarras que dançam em transe e teclados que silvam como almas a quererem sair do corpo. O prodigioso Kommunication materializa-se em seguida e ganha forma de gigante à medida que abandona as sombras em direcção à luz. Guitarra e mellotron acasalam lenta e deliciosamente, a voz de Conny Veit sopra fugazmente do nada e, quando damos conta, já não há escapatória possível da teia entorpecente e engenhosamente arquitectada. Esta é, sem dúvida alguma, uma das mais suculentas confecções saídas da panela do rock alemão na primeira metade dos anos setenta.
Kollaps acentua o ambiente místico e encantatório. Os instrumentos parecem pairar na irrealidade, um bebé chora, a música tacteia na escuridão. Tudo muitíssimo bem conseguido, com espírito, sem artifícios. Um tímido, contido, mas muito belo exercício acústico, surge na peça seguinte, Kontakt. Amacia os ouvidos e sente-se como água fresca a pingar sobre a pele. Novas contaminações psicadélicas explícitas emergem das derradeiras peças: Kollektivität e Individualität. A primeira reina ainda na dimensão ambiental e ritualística, exibindo um ritmo circular e guitarras minimais e repetitivas, muito ao estilo dos Pink Floyd da altura. A segunda acentua a energia, bombeando um ritmo intenso e tribal. A guitarra rasga o ar em espasmos de distorção, o êxtase cresce de intensidade e escoa-se sem clímax na imensidão da noite...
Trabalho de mestres, o primeiro álbum dos Gila é um salmo de referência na bíblia da kosmische musik. Ideal para voar para longe sem hora marcada de regresso. Pressa não existe por estes lados, apenas a cristalização da sensação...