Conrad Schnitzler tem 74 anos de idade e quase o dobro de discos editados. Este alemão de Düsseldorf, desconhecido para muitos, é um dos maiores pioneiros da música electrónica. Membro da primeira formação dos Tangerine Dream e co-fundador dos Kluster (que trocariam o K pelo C após a sua saída), Schnitzler foi igualmente o mentor do breve projecto Eruption, que duraria o tempo suficiente para gerar um único álbum. Enquanto os Eruption seriam uma alavanca para o movimento krautrock, esse único registo - homónimo - apenas veria a luz do dia em 2006, mais de 30 anos após a sua criação.
Muito viveu e produziu Conrad Schnitzler entretanto. A sua quase infinita discografia necessita de uma hercúlea dedicação para ser desbravada por inteiro. A trajectória do músico parece ser circular desde os primeiros tempos da sua carreira a solo. Começando por assentar em edições exclusivamente em cassette, até aos dias de hoje, em que perduram as concepções caseiras e disseminadas em CD-R, Herr Schnitzler conviveu pouco tempo com a visibilidade mediática. Talvez o excelente Ballet Statique, de 1978, seja visto hoje como a sua obra mais abrangente e influente, um dos melhores discos de electrónica já criados e uma bússola para muitos artífices e seguidores do clássico, frio e minimal som germânico. Cinco anos antes, porém, surgia outro mastodonte robótico pela mão do catedrático. Longe, muito longe, das atmosferas mais acessíveis presentes nos seus discos de finais de 70 e princípios de 80, a aventura chama-se Zug.
A história de Zug escreve-se em dois temas apenas, ou, como nestes tempos havia dois lados nas construções musicais, numa peça partida em dois: Spur e Rhythmus. Causa e consequência. Desde o início somos colocados numa locomotiva desgovernada, que avança irredutivelmente, mas sem nunca sair dos carris. Uma vertigem sonora, que não pára em estações nem apeadeiros e que tanto nos pede para mover o corpo às suas investidas, como nos titila a massa encefálica para continuar a ouvir, para saber onde a viagem nos leva. O ritmo pica como esporas, impedindo a atenção de ser desviada, mesmo sendo minimal e repetitivo. Lá atrás sucedem-se sibilares mecânicos, metálicos, metamorfoses subtis que acrescentam tonalidades cinzentas ao preto e branco dominante. Em Trans-Europe Express dos Kraftwerk, sentimo-nos igualmente transportados, mas como passageiros enamorados pelo Velho Continente. Zug é mais actual, parece arrastar-nos para uma fuga, não nos deixa olhar a paisagem, não nos deixa reter o momento. É movimento puro, o que acontecerá daqui a um minuto poderá ser exactamente o que aconteceu há um minuto atrás. Abruptamente, como se entrasse num túnel perpétuo, o movimento desvanece-se. Passaram perto de 40 minutos. De quê?
Em 2010, o disco foi reeditado tendo como base reconstruções da peça original. Provavelmente para dar continuidade, um fim, ou um sentido a uma obra tão vaga e misteriosa mas que ajudou a construir o futuro. O primeiro disco de trance music de sempre? O motor de arranque do techno inteligente? Nada disso, mas muito mais que isso...