4 de março de 2009

Zapping

Existiram ou existem poucos artistas tão profícuos como Frank Zappa. No seu tragicamente curto tempo de vida editou 57 álbums entre 1966 e 1993. O ecletismo esteve sempre presente na sua obra, onde o maior facilitismo melódico se associa ao rock e a estilhaços de doo-wop, tudo entrecruzado com a complexidade e o experimentalismo da música concreta, de Varèse a Boulez, e com pontuais reciclagens de Stravinsky. Mas a melhor maneira de classificar a música de Zappa é como inclassificável. Para além de um sentido composicional inovador e original, a sua obra sempre foi arrojada e controversa, roçando muitas vezes um humor peculiar e nos limites do politicamente correcto. Exemplo disso são obras essenciais como Over-Nite Sensation ou Apostrophe, carregadas de imagética subliminar ou declarada de sexo e escatologia. Se as paródias (brilhantes e abrasivas) podem não agradar aos mais puritanos ou conservadores, a música é transversal, conseguindo contagiar os mais diferentes públicos e influenciar artistas tão díspares como Alice Cooper ou os Henry Cow.
Entre outras contribuições mais ou menos inventivas para a música do século XX, uma das genuinamente Zappianas foi a xenocronia. Esta técnica composisional consiste em extrair um solo de guitarra ou outra parte musical do seu contexto original e colocá-la num tema completamente diferente. Melodias intrincadas e complexas mudanças de estrutura e harmonia são igualmente a sua imagem de marca, tal como no sublime instrumental Peaches En Regalia, primeira peça do não menos genial Hot Rats. É uma das composições mais geniais do seu cânone e uma das mais eloquentes cartas de apresentação da sua obra.