26 de julho de 2009

Kosmische Kosmetik VII

O segundo álbum dos Agitation Free, editado em 1973, e simplesmente intitulado 2nd, é um prodígio na classe do Krautrock mais ambiental e atmosférico. Obra construída, maioritariamente, em torno das guitarras vagueantes e transcendentes dos grandes Lutz Ulbrich e Stefan Diez, 2nd é um disco luxuriante, esmagadoramente instrumental e onde as melodias cálidas e planantes se congregam a momentos de improvisação que convidam ao abandono e induzem um estado de relaxamento deveras prazenteiro. A bruma que inicia First Communication dissipa-se aos poucos, com a suave invasão das guitarras. Primeiro, o tímido dedilhar de Lutz Ulbrich, depois, o eco divino do mago Diez, num transe crescente, virtuoso mas libertador. Os restantes membros da banda fazem o que lhes compete, sustendo a morna quietude até aos momentos finais, em que um súbito mas suave ataque rítmico engole o tema num estertor quase orgásmico. Dialogue & Random é interlúdio experimental, com ecos de música concreta, que lança chispas de Stockhausen durante a sua breve duração, até que um golpe de piano a silencia. Surge a curta mas sublime primeira parte de Laila, onde, após a excelente introdução do baixista Michael Günter, Stefan Diez se excede novamente pela positiva na forma como consegue com que a sua guitarra envolva num ciclone de prazer quem a ouve. Mas nada como o genial Laila, Part 2 para destacar o talento excepcional deste quinteto berlinense. Sobre uma base rítmica jazzística, vai sendo colorido um quadro melódico improvisado que culmina numa gloriosa pincelada de guitarras que tem de ser ouvida para se acreditar nela. Belíssimo tema do princípio ao fim, a guitarra mais trippy que nunca de Stefan Diez é capaz de dar vida a um morto.
In The Silence Of The Morning Sunrise, que principia com o canto de pássaros, atenua a ambiência, muito graças ao superlativo desempenho de Michael Hoenig nas teclas que acompanham as seis cordas, o que confere ao tema uma brisa pastoral e estival muito remanescente da onda west coast americana. Escutar este tema é como vaguear por um bosque numa manhã de Verão, onde a sombra revigora e o Sol surge, a espaços, por entre a viçosa folhagem das árvores. Esta vertente prolonga-se por A Quiet Walk, 9 minutos deambulantes por veredas electrónicas e planícies intercortadas pela singular sonoridade do bouzouki de Lutz Ulbrich. O instrumento grego inflecte algo de mediterrânico na música, a proximidade do mar, o aroma do restolho...
A terminar, o único tema vocalizado do disco. Numa atmosfera assombrada e onírica, ácida até à medula, Burghard Rausch recita Dreamland, poema de Edgar Allan Poe, como se o fizesse dentro de um escafandro dos inícios do século XX. Alimentada a mellotron, esta peça é nada menos que penetrante, possuíndo o condão de deixar vidrado e perdido nesta terra de sonho o feliz ouvinte que a procura. Densa e acessível em simultâneo, esta música é um panegírico para a alma. Em 2nd dos Agitation Free encontra-se mais um excelente álbum dos anos 70, Krautrock possuído por espíritos jazzísticos, brisas west coast e alguns pozinhos de progressivo que não matam nem moem. Imprescindível e muito aconselhável para quem, como eu, sofre de uma paixão assolapada pela Costa Vicentina. É banda-sonora perfeita para conduzir pelas estradas rodeadas de campo avermelhado pelo Sol e experienciar as praias semi-desertas daquele paraíso. Pelo que tenho oportunidade de experienciar naquelas paragens, muitos alemães sentirão o mesmo.