11 de agosto de 2010

A Marca Amarela IV

O que são os Acid Mothers Temple? No site http://www.acidmothers.com/ são descritos da seguinte forma: "Collective led by Kawabata Makoto. There are currently around 30 members, famous and unknown, musicians, artist, dancers, farmers etc. In order to follow and document their multifarious activities, in 1998 the Acid Mothers Temple family record label was set up. The Acid Mothers Temple & The Melting Paraiso U.F.O. group is just one part of collective's activities". E, das muitas encarnações desta comuna japonesa, são precisamente os Acid Mothers Temple & The Melting Paraiso U.F.O. o objecto a destacar hoje.
É preciso coragem e dedicação para acompanhar a carreira discográfica da banda. São mais de meia centena as gravações editadas desde 1996 até à data. Por entre a catadupa de lançamentos, o ecletismo perdura, mas são flagrantes as influências do psicadelismo mais duro, do space rock mais sci-fi e do improviso em regime freak-out. Basta um fugaz vislumbre de alguns dos títulos do colectivo para confirmar as homenagens: Monster of the Universe; Does the Cosmic Shepherd Dream of Electric Tapirs?; Absolutely Freak Out "Zap Your Mind!".
Preparemos, então, os tímpanos para uma das obras mais emblemáticas dos Acid Mothers em todas as suas manifestações: o monstruoso Electric Heavyland, de 2002. O fantasma de Hendrix paira, desde logo, no nome, mas o disco é um maciço apocalíptico que transcende o deus das seis cordas. Irrompem das colunas eflúvios de guitarra, improvisos diabólicos, ecos da Detroit proto-punk e alucinogéneos em abundância.
Atomic Rotary Grinding God é uma gigantesca roda em chamas, disparando chispas em todas as direcções. Encontra-se acoplada a Quicksilver Machine Head e ambas são um monstro bicéfalo, uma encruzilhada onde acontece o rendez-vous entre o krautrock mais vulcânico e os Stooges de Funhouse. E não há neurónio que não fique chamuscado perante semelhante simbiose...
A radical e ululante vocalista Cotton Casino (que faz Yoko Ono parecer Susan Boyle) estende o tapete vermelho a Loved and Confused, um vácuo demencial incinerado por guitarras drone e electrónicas espaciais. São 17 minutos esmagadores e gargantuanos, um dos mais pesados grooves que já ouvi.
No limiar da eternidade que parece ter já passado, desponta Phantom of Galactic Magnum. Se o nome parece um híbrido entre os títulos palavrosos dos Tangerine Dream e os Yes, a música abate-se sobre nós como uma torre de som a implodir. Algures entre o psicadelismo mais insano e o ruído puro, este tema é a perfeita súmula da viagem cósmica. Um querido amigo portuense contou-me uma história curiosa aquando da passagem da banda pel' O Meu Mercedes É Maior Que O Teu: no término do concerto, o guitarrista e líder Kawabata Makoto pousou o instrumento, abandonou o recinto e foi sentar-se à beira do Douro, envolto em silêncio. Após ouvir Electric Heavyland, é provável que o silêncio nunca mais seja o mesmo. Assim parece cumprir-se o desígnio do colectivo nipónico: The freakout group for the 21st' century...