Os Brainticket são, acima de tudo, uma multinacional. Um colectivo krautrock que se espraia pela Alemanha, Suíça e Bélgica. Formaram-se nos finais dos anos 60 e permanecem intermitentemente activos até hoje. Editaram uma série de discos ao longo dos anos, alguns bastante recomendáveis, mas quase todos se desvaneceram entre as brumas da memória. Estariam quase esquecidos, se não fosse por uma particular criação: Cottonwoodhill.
Foi considerado um dos discos mais trippy e alucinados da história do rock. Uma vertigem ácida e incontrolável, que não dá sossego às mentes que seduz, mas que lhes garante uma sensação de escapismo inigualável. Mas, musicalmente, o que guarda este disco para lá do desvario?
Quem começa por ouvir Black Sand pode ficar com a ideia que o LSD é fraquinho. É um tema quase funk rock, teleguiado por órgão e com ritmo encorpado. Quase tudo dentro da normalidade, até que uma voz processada entra em cena para baralhar a pauta. Em Places of Light o caso muda de figura, com a flauta mágica de Joel Vandroogenbroek (igualmente organista e o grande timoneiro do projecto) a massajar os nossos pensamentos e a voz alterada de Dawn Muir a escavar os nossos tímpanos. A seguir, a barafunda instala-se. Do nada, a relativa calmaria da música transforma-se num ataque de pânico. Vidros que se partem, ambulâncias em fuga e uma dupla de guitarra e órgão que anunciam a sua visita. Visita que tão cedo não terminará. Brainticket é um apocalipse lisérgico dividido em três partes. Um engolfo num mar de rock psicadélico, música concreta e, acima de tudo, insanidade desmesurada. A Sra. Dawn Muir surge, a espaços, num misto de paranóia e possessão, o ritmo persistente e maquinal não pára, sons de toda a espécie e feitio bombardeiam-nos ilogicamente e a única forma de parar esta enxurrada é fugir. Ou calar o som. Quem correr o risco de ficar até ao fim (se é que a peça tem um fim...), resistiu ao maior ataque ácido nos anais do rock'n'roll. Os Hawkwind ou os Pink Floyd da primeira fase parecem meninos de escola ao pé destes catedráticos intoxicados.
Ainda hoje Cottonwoodhill consegue ser estranho e perturbador e não é, definitivamente, para paladares mais sensíveis e virgens nestas lides. Na altura do seu lançamento, em 1971, seria certamente a quintessência da alucinação psicotrópica esparramada numa rodela de vinil. O inlay do disco exibe as seguintes notas:
Advice: After listening to this record your friends won't know you anymore.
Warning: Only listen once a day to this record. Your brain might be destroyed!
Discordo da primeira, concordo com a segunda. Que alguém o ponha a tocar bem alto no intervalo dos plenários da Assembleia da República.